UM MINUTO DE SILÊNCIO

A tristeza é a maior força terrena que une verdadeiramente seres humanos. Ao contrário do que muitos pensam, a felicidade nos isola por diversas vezes. As pessoas tendem a ficar mais arrogantes e cheias de si quando acham que estão felizes e empoderadas. A tristeza carrega em si o medo, a insegurança, a dúvida; nos coloca em nosso lugar. Nossa sociedade faz de tudo para maquiar a tristeza e a angústia que temos dentro de nós. De uma forma de autoconhecimento, isso é um mal imensurável para qualquer alma humana, mas entendo o porquê de toda esta maquiagem: a vida é um escândalo, pois se pararmos para pensar amiúde, percebemos que não somos nada, percebemos que corremos o risco de nos desesperar se soubermos que somos apenas um acidente da matéria.

Por isso cada vez mais vivemos em um mundo insosso, onde as pessoas buscam prazer o tempo todo, não se aprofundam em nada. Tudo isso para escapar do próprio “eu”. Mas não existe autoconhecimento sem tristeza e angústia. O autoconhecimento é profundo, e tudo que é profundo carrega em si uma tristeza. Percebam: nunca se viveu tempos tão narcísicos como o nosso. As redes sociais deixam isso claro. Vivemos em tempos de “selfies”, fotos no espelho; como nós somos ridículos. Dias atrás comecei a olhar minhas fotos antigas, fiquei com vergonha de mim mesmo. Não é possível que só eu me sinta assim?! Estamos tão sozinhos fingindo que somos felizes para agradar um bando de gente que também finge que está feliz, e no fim, isso é apenas status. O que ganhamos com isso? Curtidas?

Ah, mas a tristeza nos une, repito. Estava lembrando daquela tragédia com a Chapecoense, onde quase todo o mundo sentiu algo verdadeiro. Onde uma torcida rival fez uma das homenagens mais belas e incríveis. Lotaram o estádio na Colômbia e as ruas da cidade. Várias partidas em todo o planeta fizeram um minuto de silêncio, e talvez, diversas pessoas viveram pela primeira vez neste um minuto. Milhões de seres humanos em um mesmo local, em silêncio absoluto, com o mesmo sentimento. É de arrepiar. Só a tristeza consegue este feito.

Lembro-me de um tornado que devastou minha cidade natal. Acho que nunca vivi um sentimento de gratidão e solidariedade como aquela vez. Pela primeira vez na minha vida, consegui perceber a humanidade sendo humana. Estávamos sem luz, sem água, ruas destruídas, mas havia aquele sentimento de união entre as pessoas. Não estamos acostumados com isso, não estamos acostumados a ver a morte de perto.

E cada vez mais vemos a morte de longe, como se ela nunca fosse nos alcançar; cada vez mais tentamos nos afastar da crueldade da vida; cada vez mais deixamos de ser humanos e nos tornamos pessoas mesquinhas e bobas correndo atrás de prazer o tempo todo; adultos que mais parecem crianças. Quando na verdade, o que nos deixa em paz, é aceitar de braços abertos a vida como ela é, com todas suas mazelas e tristeza e às vezes um pouco de felicidade, porém, uma felicidade verdadeira.

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Comments (

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  1. RascunhodaNath

    Que bela reflexão! Cruel, do ponto de vista da humanidade, mas deveras realista.

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    1. Guilherme Angra

      Obrigado, Nath. Volte sempre 😉

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  2. jesicanat

    Tem razão Guilherme. Vivemos essa vazia e estéril ditadura da felicidade, somos como protótipos de uma ideia de felicidade ilusória baseada principalmente no consumo e na diversão. No é interessante que as pessoas pensem, sintam, unam-se. A falsa felicidade nos divide, nos fragmenta, e fragmentados somos mais facilmente manipulados. Todo sintoma de tristeza é sempre anestesiado, se não estiver satisfeito, algo esta errado. Penso o contrário, vejo esse tipo de insatisfação como um sinônimo de lucidez em um mundo cada vez mas vazio de significados e abundante em falsas aparências. Me pergunto; que seria da poesia, da arte, de tantas manifestações lindas, sem a inspiração de uma alma triste, sem um olhar atento para esse vazio que nos condicionaram a negar. Talvez esse vazio, esteja intimamente ligado a necessidade do autoconhecimento, de olhar para dentro e enxergar tudo aquilo que negamos para nos encaixar no que no cabe mais. Pensamentos lúcidos e singulares esses seus, obrigada pela reflexão!

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